Símbolo da rebeldia dos anos 1960, o cantor americano Bob Dylan fez nesta quarta-feira seu primeiro show na China em 50 anos de carreira, tendo de se submeter às condições impostas pela censura em um país que amplia a repressão contra a dissidência.
Apático no começo, o público, que apenas enchia dois terços do Estádio dos Operários, no centro de Pequim, entusiasmou-se depois que Dylan cantou "Hard Rain", um hino da rebeldia.
Vestido com um terno preto, uma camisa amarela e um chapéu cinza, Dylan foi passando da guitarra ao teclado e depois à harmônica, durante uma hora e meia na qual misturou canções antigas e recentes, um tanto desmerecido pela acústica do grande estádio.
Muito aclamado, sobretudo por seus solos de harmônica, Dylan foi chamado duas vezes para tocar "Like a Rolling Stone" e "Forever Young", diante de um público de pé, na maioria jovens chineses e estrangeiros mais velhos.
Tanto o espetáculo em Pequim, como o que fará na sexta-feira em Xangai foram aprovados no mês passado pelo Ministério da Cultura.
AP
Bob Dylan se apresenta em Pequim
O músico tornou-se famoso por suas canções de protesto e de inspiração política quando começou sua carreira, como "The Times They Are A-Changin'" ou o hino pacifista "Blowin' in The Wind".
Todas as canções que não interpretou nesta quarta-feira em Pequim. Tampouco conversou com o público, limitando-se à tradicional apresentação de seus músicos.
Apesar da prisão recente de vários dissidentes suspeitos de querer fomentar uma "revolução do Jasmim" na China, entre eles o artista Ai Weiwei, a imprensa oficial chinesa deu ampla ressonância à chegada de Dylan.
A revista Sanlian Shenghuo Zhoukan colocou o cantor na capa de sua última edição com a manchete: "a resposta continua soprando no vento" e o jornal Xin Jingbao publicou um suplemento de oito páginas dedicado a ele nesta quarta-feira.
Para o músico chinês Zuoxiao Zuzhou, que falou ao Xin Jingbao, Dylan é "o mais talentoso dos músicos de rock e de folk dos anos 1960".
"Era muito crítico do governo e via o rock como uma voz para os mais fracos e para as classes inferiores (...). Sou muito agradecido pela influência que ele representou para mim."
No domingo, Zuoxiao foi interrogado pela polícia em relação à prisão de Ai Weiwei.
"Bob Dylan presente em Pequim, é um ícone da dissidência em uma nação que ama a harmonia", comentou o jornal nacionalista em inglês Global Times.
"Os temas das canções de Dylan, a droga, a igualdade racial, a dignidade humana e inclusive a guerra não são temas de interesse dos chineses comuns e correntes", comentou o jornal.
O Xin Jingbao evocou a tentativa de Dylan de se apresentar na China no ano passado, mas foi barrado pela censura contra um certo número de grupos de rock estrangeiro considerados muito rebeldes por Pequim.
Na ocasião de um show dos Rolling Stones em Xangai em 2006, as autoridades aparentemente proibiram o grupo inglês de interpretar "Beown Sugar", um de seus sucessos que cita droga e sexo.
De forma geral, as autoridades são contrários à cultura rock ocidental e aos valores da rebelião contra a autoridade ou o amor livre.
Quase meio século depois de seu primeiro show em Nova York em 11 de abril de 1961, Bob Dylan deverá apresentar-se também no Vietnã no domingo, antes de viajar para Hong Kong na semana que vem.
ROBERT SAIGET
DA FRANCE PRESSE, EM PEQUIM
Folha Uol
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