Ney Matogrosso teme gravar música com a palavra masturbação: 'os brasileiros estão muito caretas'
Ney Matogrosso / Foto: Leonardo Aversa - Agência O Globo |
Nas palavras do Ney, "os brasileiros estão muito caretas" e ele não pretende surtar os ouvidos mais recatados: "Eu fui selecionando as músicas por esse caminho... Jards Macalé, Itamar Assunção e tem o Luís Capucho, um compositor extraordinário. Só que ele tem uma temática muito explícita, esse talvez seja o grande problema. A música dele que está comigo chama-se "Cinema Íris", e eu adoro.
Na entrevista, Ney contou que tem feito uns testes com a letra para ver o que as pessoas acham. "Mostro a música para uma pessoa bem doida e ela diz: 'Nossa, você vai ter coragem de cantar isso?'; então, eu pego uma pessoa bem careta e ela diz 'Nossa, nem achei tão pesada assim'. Não dá para ter parâmetro."
Para Ney, a música "é muito excitante. Não dá para tirar a frase. E eu não queria que fosse um disco proibido, não quero assustar ninguém".
- Desde o início do ano, em praticamente todas as suas entrevistas, Ney dizia que estava gravando um disco com os malditos da música e me incluiu nessa turma - conta Capucho.
Para o autor, o Ney está apenas criando um clima em torno do lançamento.
- Tenho certeza de que ele vai gravar porque ele sempre foi ousado. Quando surgiu nos Secos & Molhados, foi de uma ousadia enorme. E de lá para cá, continuou assim. Até lançou um disco estampando sua foto nu na capa. E apesar de se dizer tímido, o trabalho dele não é.
"Jean Genet da canção popular"
Luis Capucho, compositor - Foto Leonardo Aversa / Agencia O Globo |
- É um livro bem procurado por estudantes de Letras que fazem monografias sobre questões dos gays. Como é um livro muito querido, acabei querendo fazer uma dobradinha na música, e assim nasceu "Cinema Íris", que é no mesmo viés. Eu sempre digo que "Cinema Íris" é a irmã musical do livro "Cinema Orly" - explica.
Maldito? Quando lançou a música "Mamãe me adora", na década de 90, Capucho foi batizado de "o Jean Genet da canção popular" por um jornal paulista. ("Eu também sou feliz com homens/como os que amou mamãe/homens que são cheios de tensão/como diabos/homens que são como aparição/como Nossa Senhora").
- As pessoas sempre falam da minha explicitude. "Cinema Íris" é uma música ambientada num cenário erótico que mistura homossexuais e hetorossexuais. É para um ambiente mix - brinca o autor, formado em Letras e professor aposentado pela Universidade Federal Fluminense.
Apaixonado pela mãe, que morreu no carnaval de 2009, Capucho é um sobrevivente. Menino pobre, filho bastardo de um fazendeiro dono das terras onde a mãe trabalhava, ele enfrentou as sequelas de um espancamento e a Aids, que contraiu em 1996.
A possibilidade de ter sua música gravada por Ney Matogrosso é um estímulo. "Lua singela", seu primeiro CD, não teve o reconhecimento que ele desejava. Hoje, os amigos torcem para que "Cinema Íris", em análise na Biscoito Fino e na Dubas, tenha outro destino. Capucho está ansioso, mas seu coração se aquieta quando ele lembra dos conselhos da mãe Luiza: "Não fique preocupado com isso, filho, o que tem que ser, tem força. O que tem que ser é".
oglobo.globo.com
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